17 de abril de 1996. Cerca de mil pessoas estavam acampadas na “Curva do S”, em Eldorado do Carajás, sudeste do Pará, em forma de protesto. O objetivo era marchar até a capital Belém e conseguir a desapropriação da fazenda Macaxeira, ocupada por mais de 3 mil famílias sem-terra.
A caminhada, que tinha começado no dia 10 de abril, foi parada com sangue em um ataque da Polícia Militar em conjunto com pistoleiros de empresas e latifundiários no que ficou mundialmente conhecido como o “Massacre de Eldorado do Carajás”, ceifando a vida de 21 trabalhadores sem-terra, entre eles Oziel Alves, um jovem de apenas 17 anos, em nome de quem remeto a memória de todos os mártires.
No mesmo ano, em Pernambuco, minha mãe estava grávida e meu pai em greve de fome para desapropriação do acampamento Normandia. Muitos tentam me envergonhar da minha história. Muito pelo contrário: muito me orgulha ter sido gestada na terra da luta e nela ter seguido minha vida. E, enquanto primeira deputada estadual do Movimento Sem Terra, estou no parlamento para contar uma nova versão da história da terra, narrada a partir dos trabalhadores e trabalhadoras do campo.
As bandeiras estão erguidas. E as flores de abril estão grávidas de rebeldia coletiva. São quase três décadas e não deixaremos que se esqueçam dos 21 Sem Terra assassinados na Curva do S, marcada para sempre como um sinônimo de massacre e impunidade. Mais uma vez nos levantamos em todos os estados onde o Movimento Sem Terra está organizado para que se saiba e não se esqueça: 17 de abril é o Dia Internacional de Luta pela Terra – e no Brasil, é lei!
É o Abril Vermelho, é a Jornada Nacional de Lutas em defesa da Reforma Agrária e saúdo todos os companheiros e companheiras em luta aqui em Pernambuco e no Brasil afora! No nosso estado, são mais de 5 mil famílias que ocupam os latifúndios diante da ausência de andamento das reivindicações do ano passado.
Lutamos porque no nosso país temos 105 mil famílias acampadas e exigimos que o Governo Federal cumpra o artigo 184 da Constituição Federal e desaproprie latifúndios improdutivos e democratize o acesso à terra, assentando todos e todas que querem trabalhar e produzir alimentos para o povo. Há centenas de comunidades que esperam por décadas esse direito. E a paciência – neste caso – é amiga da fome e do abandono para quem está debaixo de uma lona preta.
Agro tem subsídios vultuosos do Estado brasileiro e do capital internacional, concentra riqueza e segue destruindo e desmatando
O agronegócio não pode, não consegue e não quer produzir alimentos saudáveis, pois alimentar verdadeiramente o povo não cabe no seu projeto. O Agro tem subsídios vultuosos do Estado brasileiro e do capital internacional, concentra riqueza e segue destruindo e desmatando para o avanço da monocultura para exportação. Seu rastro é de veneno, poluição, desertificação, endividamento, destruição e morte, porque é o agronegócio que financia garimpeiros ilegais, grileiros e pistoleiros que ameaçam terras e povos indígenas, quilombolas e assentamentos.
Este ano temos a possibilidade de avançar na luta pela democratização da terra com o Programa Terra da Gente, uma prateleira de terras que podem ser destinadas para a Reforma Agrária. A iniciativa do governo Lula se propõe a dar a devida prioridade e agilidade a essa demanda historicamente represada em nome dos interesses do capital.
Reforma agrária é mais acesso à terra, é inclusão produtiva, são alimentos saudáveis e diversificados, é paz no campo, é diminuição das desigualdades sociais e superação da fome e da pobreza. Do lado de cá, seguiremos nas trincheiras desta luta tão urgente e necessária para construir um novo Brasil!
Originalmente publicado em abril de 2024 no Brasil de Fato PE